Audiência pública discute necessidade de ensino bilingue para pessoas surdas em Marabá
Na manhã desta quinta-feira, dia 13 de junho, a Câmara Municipal de Marabá realizou audiência pública para discutir o atendimento a pessoas com surdez na educação. O evento foi coordenado pela vereadora Dra. Cristina Mutran, com participação de representantes de várias entidades relacionadas à causa das pessoas com surdez.
Na mesa dos trabalhos, a participação da professora Lucélia Cavalcante, vice-reitora da Unifesspa (Universidade Federal do Sul e Sudeste do Pará); Estiven Souza Paz, representante da Diretoria Regional de Ensino da Seduc em Marabá; Ágatha Campos, tradutora e intérprete de Libras da UEPA; Thays Mendes Martins, coordenadora do Departamento de Educação Especial da Secretaria Municipal de Educação (SEMED); Nacélio Souza Madeiro, presidente do Conselho Municipal da Pessoa com Deficiência em Marabá; e Marcos Vinicius Peres dos Santos, presidente da Associação dos Surdos de Marabá; e ainda Lidiane Mesquita de Lima, membro da Comissão dos Pais e Amigos dos Surdos.
Na abertura da audiência, a vereadora Cristina Mutran disse que, meses atrás, recebeu uma comissão de pais que estavam à procura de alguém que os representasse e desse a oportunidade de fala junto aos órgãos públicos. Eles sentiam necessidade de repassar angústia que tinham em ver a situação das crianças e adolescentes surdos que tinham dificuldades no aprendizado. “Eles não conseguiam acompanhar alunos ouvintes porque não há diariamente presença de intérprete de libras nas redes municipal e estadual e ensino. Por conta disso, não havia progresso necessário na aprendizagem e, então, mobilizamos para a realização dessa audiência”, explicou a parlamentar.
Dra. Cristina Mutran reconhece que a audiência pública por si só não resolve a demanda, mas ajuda a conectar os órgãos públicos para que exponham como está o trabalho voltado ao público surdo e escutar as queixas dos pais e alunos em busca de solução.
Ao usar a palavra, Lidiane Mesquita disse que tem um filho surdo e procurou a vereadora Cristina Mutran por perceber que não havia desenvolvimento adequado de seu filho no ambiente escolar. “Espero que depois dessa audiência, os rumos mudem, que o atendimento seja melhor para nossos filhos. Acompanhei meu filho na escola da creche até a série atual que ele estuda, mas sempre houve deficiência. Dá uma angústia ouvir o filho falando que não consegue entender o que se explica em sala de aula. Muitos de nossos filhos não chegam ao ensino médio porque o professor fala e não há intérprete de libras”, lamenta.
Lidiane salientou que intérprete itinerante, como há agora, não resolve, porque a criança surda vai para a escola todos os dias, e não apenas a metade do mês.
Marcos Vinícius, presidente do Instituto de Ensino à Pessoa Surda, disse que há uma grande preocupação com as barreiras existentes na sociedade, com a educação, mas também com o trabalho. “Precisamos do ensino bilingue nas nossas escolas. Todos precisam se comunicar com seus colegas. Antigamente, os surdos ficavam separados e a gente era prejudicado. Os professores do ensino regular não têm uma preocupação com os alunos surdos, o que precisa de uma mudança nas escolas. As crianças precisam ser independentes, por isso a necessidade do ensino bilingue”, desabafa.
Nacélio Madeiro, da comunidade de deficientes visuais, disse que o Conselho da Pessoa com Deficiência também recebeu mães de surdos que se queixaram da qualidade de atendimento nas escolas, de direitos que são garantidos por lei, mas que não são aplicados como deveriam. “É extremamente importante ter intérpretes para alunos surdos em sala de aula”, disse ele.
Thays Martins, da SEMED, reconhece a importância da audiência pública para que a sociedade civil tenha voz para garantia de direitos de acessibilidade para que as políticas públicas sejam implementadas ou alteradas.
Disse que na rede municipal de educação há 1.485 alunos com deficiência, todos laudados. Mas existem 470 estudantes que estão em processo de diagnóstico. Diante dessa demanda, há 820 estagiários para atender alunos com deficiência, além de cuidadores. “Temos acesso aos serviços de profissional de apoio, mas precisamos avançar para garantir os direitos de todos”, reconhece.
Em relação às pessoas com surdez, Thays pontuou que há quatro profissionais intérpretes disponíveis, número que não é suficiente para atender a grande demanda existente na rede municipal. “Infelizmente, ainda não temos a quantidade de pessoas ideal”.
Salientou, também, que o CAES garante formação para professores aonde os alunos estão matriculados, mas, reconhece que não resolve a demanda completamente.
Por fim, Thays revelou que há 28 alunos com surdez na rede municipal, mas que não são todos os deficientes com surdez que precisam de atendimento de intérprete.
A professora Ágatha Campos, da UEPA, disse que há dez anos acompanha a luta pela inclusão do curso de Letras Libras na educação de Marabá. “Consigo citar nos dedos de uma mão as conquistas alcançadas. Sou fruto de uma audiência pública, porque só foi criado o curso de letras libras na UEPA diante de uma demanda de uma audiência pública nesta Câmara Municipal”, recorda.
Ela observa que o professor de Libras precisa ser valorizado e que não adianta encher as salas de aula com intérpretes, se o aluno não souber se comunicar bem em Libras.
Estiven Souza Paz, representante da Diretoria Regional de Ensino da Seduc em Marabá, parabenizou pela realização da audiência e informou que, lamentavelmente, não há profissionais suficientes e contratados para atender o público surdo do ensino médio em todas as escolas estaduais do município.
Disse que o Colégio Geraldo Veloso foi escolhido como referência para atender alunos surdos, porque não há como colocar profissionais em todas as escolas para atender esse público. Todavia, disse que os pais ou alunos podem procurar a DRE falando sobre a necessidade de intérpretes ou professor de Libras para seus filhos e em que escola.
A professora Lucélia Cavalcante, da Unifesspa, mostrou-se emocionada por ver muitos surdos e surdas juntos, inclusive seus familiares. Disse que há mais de 17 anos pesquisa sobre educação especial, e que na universidade houve várias conquistas ao longo dos anos. “Já não cabe apenas o discurso de que não há profissionais formados, porque as universidades estão formando mão de obra qualificada de forma permanente. O Legislativo precisa nos ajudar a pressionar os gestores para garantir a contratação profissional que a lei determina”, disse ela.
Para Lucélia, o aluno surdo é o mais prejudicado na educação, porque lhe falta o direito à comunicação. “É preciso garantir acesso a todos os ambientes, não apenas na área de educação. Sonho com surdos como professores da universidade, com qualificação profissional que nos orgulhe. Esperamos projetos desta Casa que garantam os direitos dos surdos na sociedade”, disse Lucélia.
Ela também destacou que é preciso avançar na discussão do que é a pessoa surda em Marabá. Disso, dependem mudanças no currículo, nas práticas pedagógicas. “Precisamos intervir já, para que as novas gerações de surdos não tenham os mesmos problemas que a atual”, diz ela.
O vereador Márcio do São Félix, presidente da Comissão de Saúde de Marabá, defende que Marabá e região ofereçam ecoterapia para ajuda a tratar pessoas com deficiência. “Sou apaixonado pelo trabalho do CAES, um espaço público de inclusão e que ajuda muitas pessoas na busca por conhecimento”, disse ele.
Márcio também destacou a necessidade de os governantes investirem na educação inclusiva, avaliando que falta vontade dos políticos para ampliar o serviço que acolhe os alunos com deficiência com qualidade em sala de aula. “Parabenizo a doutora Cristina, por representar o Legislativo em um segmento tão importante”, disse ele.
Ao final, vários participantes da audiência puderam usar a palavra para relatar problemas na área de educação que vêm enfrentando em suas famílias, o que constou de um documento elaborado e a ser enviado para os mais diversos segmentos públicos para que implementem ações efetivas para universalizar o atendimento à pessoa surda em Marabá.