Ciclo de debates continua na Câmara
Dando continuidade ao ciclo de seminários sobre o desenvolvimento de Marabá, a Câmara Municipal de Marabá (CMM) realizou um segundo encontro para debater o tema Hidrelétrica, e dessa vez o palestrante foi Francisco Arnilson de Assis, que trouxe um ponto de vista diferente dos apresentados anteriormente. Com o título de “A Hidrelétrica vai Desenvolver Marabá? Quais as perspectivas?”, Arnilson, antes de ingressar propriamente no tema central, fez um balanço dos grandes projetos implementados ou expectados na região do Carajás e em Marabá. Na visão do palestrante, os projetos prometeram mais do que realizaram e, a reboque disso, vieram a especulação e um enorme contingente de pessoas, criando um grande ônus social.
Já na apresentação da sua apostila, Arnilson diz que a Hidrelétrica de Marabá não é uma prioridade da cidade. Na opinião dele, o empreendimento servirá ao Brasil e não aos amazônidas. “Podemos dizer não. Temos esse direito!”, diz no final do texto.
Francisco Arnilson ainda alertou sobre os danos ambientais e sociais. De acordo com ele, os projetos hidrelétricos no Brasil, em regra, vêm eivados de erros, tanto na fase de estudo quanto na execução. “Tucuruí afugentou 32 mil pessoas indenizadas com valores baixíssimos. Erram o cálculo em 300 km² da área inundada, atingido pessoas totalmente desavisadas” frisou Arnilson, dizendo ainda que muita gente ficou sem receber indenização.
O seminarista ainda chamou a atenção dos vereadores de que a construtora do empreendimento deverá construir uma cidade paralela, com uma infraestrutura independente, que acomodaria os administradores e operários, o que traria poucos dividendos ao comércio de Marabá.
Por fim, Arnilson fez uma síntese de arrecadação de UHE de Marabá. De acordo com ele, a arrecadação municipal com ISS seria da ordem de R$ 371 milhões, além da compensação financeira de R$ 350 mil, e geração de 10 mil empregos. “A Hidrelétrica não traz benefício permanente. Se o governo quer tanto fazer aqui, tem que ter algo em troca, que compense a nossa região”.
Arnislon disse que o melhor caminho para o Governo Federal resolver o problema da produção energética do país é a construção da terceira etapa da Usina Huidrelétrica de Tucuruí, que terá um custo de R$ 2 a 3 bilhões, bem menos que os R$ 12 bilhões orçados para a Hidrelétrica Marabá. Será capaz de produzir até 2.500MW de potência, e a de Marabá só produzirá 2.160 MW, além de que haveria um ínfimo impacto ambiental e social em Tucuruí, diferentemente do que ocorreria em Marabá.
Caio Júlio César Jordão, do Terra Legal, que auxiliou Arnilson na explanação, disse que o programa Terra Legal está regularizando terra que será atingida pela Hidrelétrica de Marabá. “A UHE Marabá é uma fábrica de sem terras. Só de assentamentos serão cerca de 3 mil família desalojadas. Terão 50 ou 60 mil desalojados que virão morar em Marabá, que é a maior cidade da região, e com mais estrutura. Isso vai ser como enxugar gelo, será um grande fluxo migratório para Marabá”, disse Caio Jordão.
Após a apresentação, alguns vereadores e outros convidados fizeram suas considerações e questionamentos sobre a palestra. Miguel Gomes Filho, o Miguelito, presidente da Casa, disse que a CMM tem de ter sobre qualquer matéria, um esclarecimento para se posicionar. Miguelito falou que o debate é de suma importância, disse que discorda de algumas coisas e concorda com outras. “Antes de se fazer a Hidrelétrica de Marabá, deveria se fazer a terceira etapa de Tucuruí", concordou.
Pedro Correa disse não ter dúvida de que a UHM trará muitos erros, como houve nos outros casos, como foi mostrado pelo palestrante. “Esse é um projeto que o município pode dizer não”.
Para ele, se não for construído um plano de desenvolvimento para Marabá, a obra será uma grande frustração. Perguntou sobre o que está sendo feito para que a população local seja beneficiada pelos impostos? “Não tenho dúvida que projetos dessa natureza trarão impactos gravíssimos”.
Ubirajara Sompré, vereador indígena da Câmara Municipal de Marabá, questionou sobre os benefícios do empreendimento. “Marabá não tem a estrutura de uma capital, só a população”. Para ele, o grande questionamento que deve ser feito nesse momento, é se a Usina de Marabá, com esse grande impacto, trará mais benefício ou não? “Os indígenas vão liberar o estudo dos componentes indígenas, vamos nos reunir ainda nesse mês de abril, possivelmente dia 13. A compensação financeira de 355 mil reais anual, pouco mais de 25 mil por mês é muito acanhada”, lamentou Sompré.
Já o vereador Alecio Stringari, morador e profundo conhecedor da zona rural de Marabá, disse que a região vive de explorar as riquezas naturais, acabando com várias delas. “Nossos rios e ribeirinhos serão prejudicados. Temos mais de 80 assentamentos em Marabá, e nunca o governo se preocupou em produzir lá, em dar condições técnicas pra isso. O Pará é um dos maiores desmatadores do Brasil. Falamos em agricultura familiar uma eternidade e não saímos do papel. Não tenho ainda a condição de responder se será boa ou ruim. O Sul e Sudeste do país cresceram e desenvolveram-se, mas o nosso desenvolvimento não veio. Fico com essa preocupação”, desabafou.
Coronel Araújo disse que se tivesse como optar, diria que a Hidrelétrica de Marabá trará bem mais ônus para Marabá. “Os grandes projetos não deixaram muito pra Marabá, mas aprendemos a lição. Acho importante a diversificação da economia. Se não tiver jeito a Hidrelétrica, temos que puxar o máximo possível das condicionantes para melhorar a vida da população”.
Além dos vereadores e cidadãos de Marabá, o encontro também teve a presença do vereador Divino, de São João Araguaia, e João da Cruz, presidente da Colônia de Pescadores do mesmo município. Divino disse que muitas pessoas estão procurando tirar o título de suas propriedades em São João, porque moram lá, e não têm documentação do terreno, e querem a sua indenização. “Sou contra, enquanto o Governo Federal não nos diga para onde nosso povo vai. Saio convicto em ser contra, temos que debater e mostrar para onde nossa população vai”, advertiu, informando que 95% do município de São João será inundados.
João da Cruz, presidente da Colônia de Pescadores de São João do Araguaia, disse que veio para reunião a fim de adquirir conhecimento. Segundo ele, 85% dos moradores são trabalhadores da zona rural e sofrerão impactos de toda sorte. “Vamos ficar com um território pequeno, e onde vamos colocar essa população? Apenas 6 milhões de reais (que é a compensação financeira sobre a área atingida de São João) não pagam o preço da nossa cultura, da segurança de dormirmos de portas abertas. Quero somar com vocês porque nossa categoria, os ribeirinhos, será a mais atingida. Vamos ser obrigados a sair de onde não queremos sair. Temos nossos entes queridos enterrados, nossas casas que nascemos lá. Que benefício esse projeto trará para São João do Araguaia?”, questionou.
Arnilson finalizou sua apresentação reiterando que a hidrelétrica não traz benefícios permanentes, e ainda ocorrerão malefícios com o tempo, quando a fase de implantação do projeto chegar ao fim. “Haverá um novo ciclo de problemas urbanos, refugiados. Queremos alternativas de desenvolvimento menos absurdas. Por que não planejar o desenvolvimento através de uma Agência de Desenvolvimento e uma Delegacia do Conselho Regional de Economia para Marabá? Precisamos colocar a sociedade no debate. Por que não dizemos não?”, perguntou.