MP e vereadores questionam Vale sobre condicionantes para o Complexo São Félix
Após diversas reuniões, duas audiências e a criação de uma relação com demandas prioritárias para o Complexo São Félix, o Ministério Público Estadual (MPE), provocado pela vereadora Vanda Américo, realizou na manhã desta quinta-feira, 12, na sede do órgão ministerial, audiência pública que contou com a participação da comunidade, representantes de associações, vereadores, imprensa e promotores, para discutir as condicionantes da mineradora para aquele núcleo, em função do impacto socioambiental que a duplicação da Estrada de Ferro Carajás (EFC) trará.
Na oportunidade, também foi discutido o andamento da obra de expansão da ferrovia e a construção do muro em perímetro urbano de Marabá, feito pela empresa e que vem trazendo grandes transtornos para a comunidade.
Mayanna Souza Queiroz lembrou que já havia ocorrido um primeiro contato com Maurício Cunha, analista de relação com a comunidade da Vale, e que esteve no local da duplicação com um grupo da empresa, onde foi explicado o que seria feito na área. “Fizemos uma audiência no São Félix e a Vale não compareceu, as pessoas ficaram na expectativa. Esse é o momento da empresa expor o que vai trazer para a cidade, e nós avaliarmos e estipularmos um acordo ou ajustamento diante do que será mostrado”, observou.
Selbe Meirelles, gerente de relacionamentos de projetos da Vale, fez considerações preliminares sobre o projeto, dizendo que o alvo da reunião tem foco na atuação social. Ele sintetizou o andamento da expansão, disse que o licenciamento do empreendimento, que corta dois estados, Pará e Maranhão, se iniciou em maio de 2008 e foi feito pelo Ibama-Brasília, e que apenas em novembro de 2012 é que foi obtida a licença de operação. “Previamente tivemos cinco reuniões públicas em várias cidades ao longo da ferrovia, no Pará e Maranhão. A Vale expôs e escutou as considerações da população”, disse o representante.
Meirelles argumentou que o projeto de expansão da ferrovia é extremamente importante para o País e para o Pará, sendo que hoje, é o maior de infraestrutura logística privado do Brasil.
O gerente de relacionamento da Vale informou aos presentes, que na comunidade do São Félix não haverá obra de duplicação no momento, e que as condicionantes levam em conta o grau de impacto em cada local. Ele afirmou que somente após a duplicação da ponte, que ainda está em estudo, é que poderá ser duplicada a estrada no núcleo São Félix. “O projeto ainda está em estudo. Nos próximos 4 ou 5 anos não teremos duplicação no São Félix”.
Meirelles disse ainda que as linhas duplicadas são distantes 5 metros da Estrada de Ferro, e com a obra haverá um total de 266 km de linhas duplicadas. “Apenas a partir de 2020 é que se tem previsão para a duplicação da ponte”.
O representante da multinacional afirmou que o estudo ambiental tem 7 mil páginas, e que a licença para a execução da obra tem 29 programas que abrangem a ferrovia como um todo. “As condicionantes não vêm específicas para nenhum município”.
Vanda Américo disse que os moradores do São Félix desejam que os benefícios cheguem ao local e não apenas os impactos negativos. Vanda falou da audiência pública realizada no São Félix, que hoje é um dos bairros mais populosos de Marabá, com quase 60 mil habitantes, frisando que nada foi ventilado em termos sociais como condicionantes. “Fizemos uma pauta enxuta das reivindicações. O Maurício tentou desmobilizar a audiência no São Félix. Por isso solicitei essa audiência ao MP, queríamos manter uma mesa de negociação com a Vale, não temos escolas; a Estação Conhecimento não funciona; faltam hospitais; temos problema de água”. Para ela, a prioridade número do bairro é a saúde.
Vanda discordou do que foi exposto pelo representante da empresa e disse que não acredita que a duplicação não ocorrerá no núcleo São Félix. “Não se pode afirmar que não haverá duplicação naquele local. Não existe compromisso social com essa área. Aquela pobreza vizinha à ferrovia mostra isso. Temos que trazer resposta positiva para o povo, queremos estabelecer diálogo e uma mesa de negociação com a empresa. Não há nada previsto para o local”, frisou a vereadora, que propôs reformas nos dois postos de saúde; implantação do Samu e ambulância e duas escolas de ensino fundamental de 12 salas de aula cada.
Vanda sugeriu ainda, que as próximas reuniões com a Vale devem focalizar esse assunto, e que todas sejam no Ministério Público. “Está sendo construído um muro na cidade, e corta o São Félix. A população está sendo atingida. Eles vão fazer um viaduto porque terão duas estradas de ferro” proferiu Vanda.
A vereadora disse que a Vale destinou R$ 84 milhões para o consórcio formado pelos municípios do Maranhão afetados pela obra de expansão da ferrovia. Para ela, é necessário que se explique qual foi o critério utilizado para essa distribuição.
O vereador Ilke Moraes contrapôs a argumentação de Selbe, dizendo que o Plano Diretor de Marabá não prevê a construção do muro. Ilker disse também, que há pouco tempo foi veiculado em um jornal local que o minério de Carajás se encerrará em 2027. O representante da Vale informou desconhecer a matéria e disse que tem licença para a construção do muro.
Luís Carlos, gerente de relações com as comunidades da Vale, disse que a informação sobre esse recurso destinado ao Maranhão, não procede. De acordo com ele, não há nenhum número da Vale que estipule esse valor. “Com o consórcio estamos recebendo projetos, estamos discutindo e não foi implantado nenhum. Temos uma carteira de projeto para 2014, da ordem de R$ 43 milhões para ser realizada. Todas as reivindicações serão analisadas e serão debatidas com o Conselho Gestor da empresa, para serem liberadas ou não”. Ele lembrou que todos os projetos são apresentados ao Conselho e depois são solicitadas verbas com justificativas para que eles sejam implementados. “Cada município manda seus secretários para essas reuniões, apresentam seus projetos fundamentados e suas demandas, para analisarmos e viabilizarmos”.
Segundo Luis Carlos, mesmo com a aprovação do orçamento da Vale para 2014 já concluído, nada impede que os projetos apresentados agora possam ser realizados no próximo ano, tudo depende da análise do Conselho.
Ainda diante do exposto, Selbe Meirelles afirmou que o muro é uma questão de segurança adotada pela empresa e que possui licença para a implantação do mesmo. Disse que houve uma reunião com o prefeito municipal João Salame, onde foram apresentadas as obras previstas e a Vale solicitou ao gestor propostas de projetos em nome da prefeitura. Até o momento, segundo os representantes da empresa, não foi recebida nenhuma do município. Eles afirmam também, que já aconteceram duas ou três reuniões técnicas com o pessoal da Secretaria de Obras de Marabá (SEVOP).
Ainda segundo os representantes da empresa, os projetos devem ser protocolados e, uma vez validados pela equipe técnica, são encaminhados para aprovação do Conselho Gestor, no Rio de Janeiro. Eles ratificaram também, que os R$ 43 milhões são demandas que serão apresentadas, não significando que esse recurso todo será disponibilizado.
Raimunda Maria Medes da Silva, representante da Associação dos feirantes do São Félix, pediu um aterro e um galpão para a feira.
O vereador Ronaldo Yara sugeriu que na próxima reunião o executivo esteja presente, justamente para dirimir as divergências e para que haja celeridade nas execuções das obras.
Gilsim Silva, ex-vereador e morador do núcleo São Félix, argumentou da necessidade de se ter um olhar mais respeitoso com o São Félix. “A ferrovia já passa ali há mais de trinta anos, falta sinalização eletrônica para salvar o bem maior da comunidade, que é a vida”. Para Gilsim, seria fundamental o Poder Executivo estabelecer uma equipe para acompanhar os projetos da Vale.
Marcos Senna presidente da Associação de Moradores do Residente Vale do Tocantins, falou que a comunidade fica apenas com o apito do trem, e seria importante que os projetos fossem contemplados ainda em 2014.
A promotora Mayanna Queiroz pediu que fosse dado um suporte técnico, fornecido pela Vale, para a elaboração de projetos que venham a minimizar esses impactos e deixem algum beneficio social para a região, como foi feito com a Alpa. Sugeriu também que um representante da prefeitura para acompanhar as reuniões e o andamento do processo, e que este seja o secretário de Obras, Antônio Pádua.
A promotora disse ainda, que o que está previsto de obra, de acordo com o que lhe foi passado para o núcleo São Félix, são 5 km de asfalto, apenas.
O promotor Júlio César questionou Meirelles e entendeu que o escoamento continuaria a ser feito apenas por uma ponte, mesmo com a duplicação parcial da estrada de ferro, o que foi rapidamente confirmado pela gerente.
A promotora Josélia Barros disse que é importante ouvir o clamor da população. "Ela é quem deve decidir qual investimento é prioritário para a comunidade".
Foi acordado que será marcada uma nova audiência com todos os atores envolvidos e a data, assim que confirmada, será divulgada. Ao final da reunião, foi sugerido e solicitado pelos participantes, que os projetos prioritários para o Complexo São Félix são: construção de duas escolas; duas UPAS; construção do CRAS; feira livre e cemitério.
Participaram da audiência os promotores Júlio Cesar Costa, Mayanna Queiroz e Josélia Barros Lopes; os vereadores Ilker Moraes, Vanda Américo, Ronaldo Yara e Irmã Nazaré; representantes do núcleo São Félix e funcionários da Vale.