Projeto de Emenda a Constituição sobre demarcação de terras indígenas é debatido na Câmara
A Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania, que debate proposta de emenda à Constituição, para acrescentar às competências exclusivas do Congresso Nacional de aprovação das demarcações de terras tradicionalmente ocupadas pelos indígenas, realizou na tarde desta segunda-feira, 7, audiência pública na Câmara Municipal de Marabá.
Segundo os autores da proposição, há necessidade de se instaurar um maior equilíbrio entre as atribuições da União relativas à demarcação de terras indígenas, assegurando a participação dos Estados-membros nesse processo. A exigência de aprovação pelo Congresso Nacional estabelecerá, desse modo, “um mecanismo de co-validação” no desempenho concreto daquelas atribuições, evitando que a demarcação de terras indígenas crie obstáculos insuperáveis aos entes da Federação, em cujo território se localizam tais reservas.
Geovanni Queiroz, autor da solicitação, falou que esse ato externo é um braço da Comissão Especial que trata de PEC n° 215, que discute não apenas a demarcação de terras indígenas, mas a vontade do índio na aldeia e as condições que a Constituição as impõe. “Debatemos, acima de tudo, a qualidade de vida dos indígenas, mecanismos que os valorizem, assegurando a reservas indígenas, construindo uma alternativa justa”, disse o deputado.
Durante o evento, os indígenas entraram com cartazes de não à PEC 215, mostrando a insatisfação e a posição contrária do grupo a proposição governista. Primeira a fazer uso da palavra, Iredyan Xikrin, da tribo Xikrim, chamou a atenção para a demarcação, falando que a conferência foi transferida para Marabá, para que houvesse um contato e um encontro mais perto dos povos indígenas e da sua realidade. “Não queremos saber dessa PEC, nós achamos que vai nos prejudicar. Nossos povos estão esquecidos, de Parauapebas para a aldeia Xikrin são mais de 400 km. Sabemos das nossas dificuldades, principalmente na saúde e educação, isso deveria estar sendo discutido aqui”, criticou a indígena.
O cacique Kine K. Parkatejê, da aldeia Parkatejê, da etnia Gavião, seguiu a mesma linha de raciocínio de sua antecessora, dizendo existir uma preocupação com a saúde e educação dos povos indígenas. “Somos contra a PEC 215, que é um desrespeito com os indígenas. O resto que temos querem nos tirar. Queremos um Brasil melhor, mas com os índios acompanhando o processo. Lembrem que nós, hoje, somos 75 mil índios, e então temos nossos direitos a nossas reservas. Temos que permanecer na nossa tradição, vamos lutar pelos nosso direitos”.
Ubirajara Sompré, primeiro e único vereador da Câmara Municipal de Marabá indígena, falou sobre as mazelas que os índios sofrem, deixando claro que as populações indígenas não legitimam a PEC em questão e a conferência, mas sim, o direito de se manifestar contra. “Não à PEC! A Constituição nos garantiu e nos concede o direito originário de usufruto das nossas reservas e terras. O de desenvolvimento do País vem acabando com a cultura do índio. Infelizmente, hoje, nossas terras são o sustento do Brasil. Temos que ter sustentabilidade no progresso”.
Ubirajara ainda citou que o projeto de emenda à Constituição é inconstitucional. “O ministro da Justiça já disse que esse projeto é inconstitucional. Estamos morrendo nas aldeias. Por que os deputados não vêm discutir a educação e a saúde do nosso povo, e a preservação das nossas terras. Parece que somos a pedra no caminho do Congresso brasileiro. Essa PEC tem várias causas institucionais” disse o parlamentar.
Na avaliação de Sompré, os índios irão brigar até o fim contra a PEC 215. “Em Brasília, fomos enganados, os deputados rasgaram com a gente a PEC 215 e agora querem voltar a discutir a mesma”, desabafou.
Zequinha Marinho disse que esse é o caminho para a solução de alguns problemas para o futuro. “O processo democrático é esse. Lamentavelmente as questões indígenas têm sido debatidas às escuras. Por causa da falta desse debate, algumas famílias vêm sendo sacrificadas. Em um país democrático e com tanta terra isso é um absurdo”.
Zequinha afirma que a PEC 215 não tira ou põe direito a ninguém. Para ele, o projeto apenas traz às claras a discussão e regulamenta algo que hoje passa apenas pelo Executivo, dando espaço para que o Congresso Nacional debata o assunto. “Deixa de ser uma decisão esquisita e estranha, e passa a ter um processo normal e democrático. A Constituição de 1988 já sofreu muitas emendas. A sociedade vai exigindo clareza e transparência. As reservas vão continuar sendo feitas e criadas”, explicando que, hoje, o processo é feito por técnicos da Funai e o Governo apenas homologa, sem grandes discussões no parlamento. “A PEC vem botar ordem na Casa. Tem terra pra todo mundo, precisamos saber distribuir”, relatou o deputado.
Geovani Queiroz comentou que a PEC pode ser ampliada para discutir o direito dos índios, e de acordo com ele, é exatamente por isso que a Comissão realizou o debate em Marabá, para ouvir os maiores problemas que afetam os indígenas. “Acho que a PEC precisa ser feita para ampliar os seus direitos, para poderem utilizar os recursos de suas terras.Queremos sentar com vocês e discutir. Não somos adversários. Faltam regras mais claras nesse projeto”.
Questionado pelos índios sobre o poder que ruralistas tem no Congresso e o por que de não levar a discussão o Estatuto Indígena no plenário da Câmara dos Deputados, que, na visão dos indígenas conferi ganho de direitos substanciais aos índios, o deputado falou que realmente existe a necessidade de se rever o estatuto, onde se garante o direito e a condição do proprietário da legal da terra, o índio, fazer manejo sustentável da mata, comercializar minério e outras coisas. “O indígena está mendigando saúde e educação, que deixem que eles explorem de forma sustentável sua propriedade”.
De acordo com os parlamentares, o projeto não está fechado e continua aberto ao debate, visando a lapidação de uma proposta que traga melhoria efetiva para todos os lados.