Promotores do Trabalho apresentam relatório à CPI da Vale na Câmara de Marabá

por Adriano Ferreira Carvalho Moura publicado 24/08/2022 10h34, última modificação 24/08/2022 10h34

Na manhã desta terça-feira, dia 23 de agosto, a Comissão Parlamentar de Inquérito da Vale na Câmara Municipal de Marabá recebeu dois procuradores do Trabalho, que apresentaram um relatório sobre a atuação do MPT no combate a irregularidades trabalhistas na Barragem Mirim, no Projeto Salobo. A reunião aconteceu no Plenarinho da Câmara Municipal, com participação de vereadores, líderes comunitários e representantes da Vale.

A reunião foi conduzida pelo presidente da CPI da Vale na CMM, vereador Ilker Moraes, com participação de Marcelo Alves (relator) e Cabo Rodrigo, secretário. Moraes explicou que a Comissão Parlamentar de Inquérito foi instalada para investigar a atuação da mineradora Vale no Projeto Salobo e os passivos socioambientais causados pela mineradora. “Essa reunião surgiu a partir de uma informação na mídia nacional sobre a abertura de uma Ação Civil Pública por parte do MPT, que investigava a localização dos colaboradores da Vale e terceirizadas que estão abaixo da barragem Mirim, do Projeto Salobo. A informação é de que seriam cerca de 1.800 funcionários de 26 empresas terceirizadas”, diz.

Pelo MPT, vieram á Câmara os procuradores do Trabalho Ulisses Dias de Carvalho e Érika Garcia Trevizo, enquanto pela mineradora compareceram Luiz Veloso, gerente institucional da Vale no Pará; e Saulo Lobo, supervisor de relações institucionais em Marabá.

O procurador Ulisses Carvalho parabenizou a Câmara de Marabá pela discussão dos passivos socioambientais do Salobo e disse que política pública de responsabilização socioambiental é relevante e não pode partir só da União, mas que estados e municípios também têm responsabilidade, principalmente quando se trata de um negócio muito rentável e que diz respeito à saúde dos trabalhadores.

Ele lembrou que a primeira denúncia sobre a Barragem Mirim foi apresentada ao MPT em 2019, alertando sobre possíveis irregularidades que ocorriam no Salobo. Por conta disso, foi instaurado inquérito, mas observa que em nenhum momento da instrução questionou-se sobre a estabilidade da barragem. “Não discutimos se ela é segura ou não, apenas sobre cumprimento de legislação que proíbe instalações desse tipo de empreendimento a jusante de barragem. Não é possível que uma empresa desse porte continue descumprindo a legislação. Não esperamos que as coisas aconteçam em dez dias, mas não dá para a empresa permanecer com esse tipo de estrutura proibida por lei”, argumentou.

Há uma ACP tramitando na Justiça do Trabalho, em que o MPT pede o cumprimento, por parte da Vale, de 31 obrigações de fazer, as quais estão em processo de negociação. Segundo o procurador Ulisses Carvalho, o grande dilema em relação ao preparo dos trabalhadores do Salobo quanto ao que fazer em caso de alerta ou mesmo rompimento da barragem, os funcionários da Vale estão bem preparados, enquanto os das empresas terceirizadas não têm noção de que atitude adotar. “Há uma lógica aí. Se a terceirização traz eficiência econômica, traz barateamento de custo para a empresa contratante, um dos primeiros itens cortados é a questão de segurança e saúde do trabalhador”, avalia.

 

Em março deste ano, o Ministério Público do Trabalho precisou ingressar com uma ação na Justiça para concessão de medida liminar para que a Salobo Metais e a Vale cumprissem algumas obrigações, como impedir a permanência trabalhadores diretos, indiretos, de fornecedores de produtos ou serviços, ou quaisquer transeuntes, na chamada Zona de Autossalvamento da Barragem Mirim, exceto os trabalhadores estritamente necessários ao desempenho das atividades de operação e manutenção das barragens ou de estruturas e equipamentos a ela associados.

O MPT também solicitou a desmobilização imediata das seguintes estruturas, de forma a impedir a permanência de trabalhadores, exceto daqueles estritamente necessários ao desempenho das atividades de operação e manutenção das barragens ou de estruturas e equipamentos a ela associados: Estação de Tratamento de Esgoto - ETE; Oficina Centralizada e Armazém; Transportadores do Salobo III; Armazém Salobo III; Estruturas de Armazém Salobo III; Central de Concreto Salabo III; Posto de Combustível; TCLD Salobo; Britagem Secundária Salobo; e Pátio da Castanha.

Ulisses Carvalho reconhece que a Vale vem cumprindo algumas das obrigações impostas pela Justiça e algumas estruturas estão sendo desmobilizadas, assim como seus trabalhadores.

Por fim, o procurador do Trabalho sugeriu à sociedade e à CPI do Salobo, que se faça um levantamento das barragens da Vale nesta região, com um mapeamento dessas estruturas e posterior encaminhamento para as autoridades competentes.

Luiz Veloso, da Vale, garantiu que o diálogo está acontecendo abertamente dos dois lados e que a mineradora já implementou e está tomando várias medidas para que consiga minimizar todos os impactos que possam eventualmente acontecer.

“Não vamos, jamais, esquecer ou cansar de pedir desculpas pela tragédia de Brumadinho. Mas também precisamos mostrar que a partir dessa tragédia muitas mudanças foram implementadas. No Pará, todas as nossas barragens têm modelo construtivos diferentes da mineração em Minas Gerais. O método construtivo de nossas barragens é diferente de Minas, possui mais segurança, mas não elimina nenhum tipo de providência em relação às nossas barragens”, disse Veloso.

O gerente da Vale afirmou que a empresa mantém centro de monitoramento das barragens, com vários equipamentos que foram implementados para observação durante 24 horas, com vários instrumentos de medição. “Temos controle de acesso e já eliminamos vários problemas”.

Luiz Veloso disse que nesta fase de discussão com o MPT, a Ação Civil Pública tem sido importante para os encaminhamentos que estão acontecendo. “Evoluímos na questão do treinamento dos trabalhadores, envolvendo a Defesa Civil, Corpo de Bombeiros. Realizamos treinamentos para que as comunidades próximas se sintam seguras. Estamos de portas abertas para fiscalização das barragens, para que a empresa apresente todas as informações necessárias. O diálogo e proximidade trarão melhorias, porque não somos donos da verdade. Estamos dialogando e vamos continuar assim”, disse ele, informando que nesta quarta-feira ocorre reunião administrativa em Belém para continuar o diálogo.

O vereador Marcelo Alves disse que a CPI da Vale em Marabá é histórica e apresentará encaminhamentos para melhorar a relação entre a Vale e o município. “Sempre soubemos que Marabá foi deixada de lado pela mineradora em relação a outros municípios como Parauapebas e Canaã dos Carajás”.

Ele lamentou que a Vale esteja fazendo tratativa com o Executivo de Marabá em relação à construção de novas pontes sobre o Rio Tocantins. “A Câmara não foi ouvida e agora os dois entes estão discutindo contra partida. Não somos favoráveis a tantos recursos para asfalto e quase nada para a saúde”, disse Marcelo.

O vereador Márcio do São Félix disse que o Executivo está pecando em não convidar vereadores para participar de discussões. Para ele, quando as coisas não dão certo, o primeiro culpado é o Legislativo, embora o Executivo tenha responsabilidade. “Marabá não vive crise financeira, mas crise administrativa. Poderíamos ter diálogo mais aberto, mas isso não está acontecendo. A estrutura pública no Núcleo São Félix já não nos atende. Há ocupação irregular de 3.000 casas que não foram concluídas com recursos federais. Temos foco grande de caos social implantado no São Félix. Ao todo, 6.500 unidades habitacionais populares. A pavimentação é muito necessária, mas temos outras necessidades”, sustentou.

Representantes de moradores e da Unifesspa também apresentaram questionamentos em relação à barragem Mirim, no Salobo. O professor Leonardo Brasil, de Geologia, disse que a universidade vai realizar trabalho técnico científico para avaliar possíveis danos em caso de a referida barragem ceder.

Rodrigo Botelho, presidente da OAB, também considerou importante a mobilização coletiva para que haja diálogo permanente. “Falta estrutura da Agência Nacional de Mineração em nossa região e precisaríamos de um estudo da mineração do dia a dia. Não podemos ficar longe desse debate. Estamos no meio de um grande polo de riqueza e precisamos permanecer em alerta”.

Por fim, o vereador Ilker Moraes informou que a CPI deverá convocar o presidente da Vale, Eduardo Bartolomeo, em virtude de vários problemas identificados ao longo da atuação da comissão. “Não podemos ser acusados de omissão. Podemos ampliar o foco da CPI e atuar em relação à ponte sobre o Rio Tocantins”, alertou.